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UMA CIDADE SEM MEMÓRIA CULTURAL É UMA CIDADE SEM FUTURO HISTÓRICO

Guimarães Passos


Maceió - AL
1867 - 1909
Fundador da Cadeira 26 da Academia Brasileira de Letras.

Guimarães Passos (Sebastião Cícero G. P.), jornalista e poeta, nasceu em Maceió, AL, em 22 de março de 1867, e faleceu em Paris, França, em 9 de setembro de 1909.
Era filho do Major Tito Alexandre Ferreira Passos e de Rita Vieira Guimarães Passos. Seu avô, José Alexandre de Passos, fora advogado e professor, dedicado também ao estudo de questões vernáculas. Guimarães Passos fez seus estudos primários e os preparatórios em Alagoas. Aos 19 anos foi para o Rio de Janeiro, onde se juntou aos jovens boêmios da época. Era a idade de ouro da boemia dos cafés, e não poderia haver melhor ambiente para o espírito do poeta. Entrou para a redação dos jornais, fazendo parte do grupo de Paula Ney, Olavo Bilac, Coelho Neto, José do Patrocínio, Luís Murat e Artur Azevedo. Colaborou com a Gazeta da Tarde, a Gazeta de Notícias, A Semana. E nas suas colunas ia publicando crônicas e versos. Nos vários lugares em que trabalhou, escrevia também sob pseudônimos: Filadelfo, Gill, Floreal, Puff, Tim e Fortúnio.
Foi também arquivista da Secretaria da Mordomia da Casa Imperial. Com a proclamação da República, e extinta essa repartição, Guimarães Passos perdeu o lugar e passou a viver unicamente de seus trabalhos jornalísticos. Com a declaração da revolta de 6 de setembro de 1893, aderiu ao movimento. Fez parte do governo revolucionário instalado no Paraná, e lutou contra Floriano Peixoto. Vencida a revolta, conseguiu fugir. Exilou-se em Buenos Aires durante 18 meses. Lá colaborou nos jornais La Nación e La Prensa e fez conferências sobre temas literários relacionados ao Brasil.
Em 1896, de volta do exílio, foi um dos primeiros poetas chamados para formar a Academia Brasileira de Letras. Escolheu para seu patrono outro boêmio, o poeta Laurindo Rabelo. Encontrou no Rio de Janeiro a sua geração inteiramente transformada. Alguns dos antigos companheiros encontravam-se agora em postos bem remunerados, eram reconhecidos, enquanto ele permanecia como o último boêmio. Ficou doente de tuberculose e, não conseguindo melhoras no Brasil, partiu para a ilha da Madeira e, daí, para Paris, onde veio a falecer, em 1909. Só em 1921, a Academia Brasileira conseguiu fazer trasladar os restos mortais para o Brasil. Para aqui vieram acompanhados dos de Raimundo Correia, falecido em Paris em 1911.
Poeta parnasiano, lírico e, às vezes, um pouco pessimista, Guimarães Passos foi também humorista na sua colaboração para O Filhote, reunida depois no livro Pimentões, que publicou de parceria com Olavo Bilac. Ao tratar de Versos de um simples, José Veríssimo viu nele o "poeta delicado, de emoção ligeira e superficial, risonho, de inspiração comum, mas de estro fácil, como o seu verso, natural e espontâneo, poeta despretensioso, poeta no sentido popular da palavra".
Fonte:ABL

Manuel Bandeira: "Guimarães Passos: poeta e boêmio"
Nas suas definições, Manuel Bandeira relaciona Guimarães Passos entre os ''são do Norte que vêm.'' No discurso em sua sucessão na cadeira 26 da Academia Brasileira de Letras, Paulo Barreto, mais conhecido como João do Rio, conta, com a graça costumeira dos seus textos, como se deu a vinda desse alagoano para o Rio: ''Por uma certa manhã dos fins do século passado - quase quatro lustros antes da terminação desse memorável século da ciência, da luz e do positivismo - um jovem poeta de Maceió resolveu acompanhar a bordo três amigos, que de viagem se faziam para a Corte, capital do império. O poeta era belo mancebo tropical. Alto, elegante, bíceps gigantes, largo busto, com o desabrocho da cintura estreita, longas mãos, cabeleira crespa formavam-lhe a beleza máscula; e quando ria, um riso jovial, entre a ironia satisfeita e a ingenuidade irônica, mostrava aos que o ouviam uma esplêndida dentadura de trinta e dois belos dentes. Era forte, era são, esse mancebo amável. Chamava-se Sebastião Cícero dos Guimarães Passos''.
O moço poeta entrou para o navio com as melhores disposições de voltar a terra uma hora após. Como sempre foi e ainda é costume, apenas nas viagens por mar, afogar as despedidas numa bebida, qualquer bebida em comum, o poeta e os três viajantes abancaram no convés em torno a uma pequena mesa. A conversa animou-se.
Quando ela ia mais animada, Sebastião dos Guimarães Passos ergueu-se, estreitou nos braços os três amigos e, com o seu passo solene - o passo heráldico, como vieram depois denominá-lo -, encaminhou-se para o portaló. Aí viram seus olhos mover-se à paisagem e no oceano. O navio singrava havia meia hora e dentro em pouco estaria em alto-mar. Sebastião sorriu e voltou aos amigos.
Esse poeta da boemia, da época áurea da boemia dos cafés, integrante do grupo onde se alinhavam Paula Ney, Bilac, Coelho Neto, Luís Murat, José do Patrocínio e Artur Azevedo, tem vida e morte divididas em quatro navios: esse que o levou de Maceió para o Rio; aquele que o deixou no exílio em Buenos Aires, para se livrar de Floriano Peixoto; o terceiro, que o conduziu à Ilha da Madeira em busca de curar a tuberculose, que o mataria em Paris, a 9 de setembro de 1909, aos 42 anos, pois nascido em 22 de março de 1867; o quarto, e último navio, que repatriou os seus restos mortais, em 1922, por iniciativa da Academia Brasileira de Letras.
Desses três embarques e desembarques, João do Rio dizia ser o mar, ao qual sempre o prendeu um secreto amor, que levava Guimarães Passos, sem nada planejar. Depois de fechar o ciclo mais alegre da sua existência, que foi a primeira temporada carioca, sucederam-se viagens ao Prata e a derradeira para a Europa.
''O oceano marcou, de fato, as três grandes partidas em que se dividiu essa vida: a partida para a alegria radiante, a partida para a tristeza solidária, a partida para a morte'', disse João do Rio, no discurso de posse.
Quando ele chegou à Corte, estava no fecundo calibre dos 19 anos para a boemia, para escrever em jornais, para fazer versos e para ser, por algum tempo, arquivista da Secretaria da Mordomia da Casa Imperial.
Fiel boêmio, convidado para ser um dos fundadores da Academia Brasileira de Letras, fez seu patrono outro boêmio, o poeta Laurindo Rabelo. E acabou por ter agora, no presente, um sucessor - que lástima! - nada boêmio. Muito pelo contrário. Faltam-me talentos para tanto.
A esse poeta parnasiano, mais ou menos pessimista, não faltou a veia humorística que está na colaboração para O Filhote, depois reunida no livro Pimentões, publicado em parceria com Olavo Bilac.
Todos os que estudamos a vida e a obra de Guimarães Passos temos necessidade de citar José Veríssimo, que encontrou nele, ao tratar de Versos de um simples, ''um poeta delicado, de emoção ligeira e superficial, risonho, de inspiração comum, mas de estro fácil, como o seu verso, natural e espontâneo, poeta despretensioso, poeta no sentido popular da palavra.''
Veja-se como Veríssimo está certo nessa quadrinha de Guimarães Passos:

''No momento em que te deixo
Deixa-me toda a alegria;
A porta dos olhos fecho
Porque não vejo o que via.''


No jornalismo brasileiro, colaborou em A Semana, Gazeta da Tarde e Gazeta de Notícias. Na Argentina, em La Nación e La Prensa. Também se assinava Filadelfo, Gill, Floreal, Puff e Fortúnio.
O poeta incursionou pelo tom pessimista, mas logo se embeiçou pelo tema do erotismo, coerente com o seu embeiçamento vário e constante pela mulheres, atraídas pelo belo homem que ele era.
Além do já referido Versos de um simples, que é de 1891, são obras desse filho de um tabelião alagoano: Hipnotismo, uma comédia em versos, Tratado de versificação e Dicionário de rimas, ambos em co-autoria com Bilac.
Meio contra a vontade, deixo de lado o anedotário do que Guimarães Passos aprontou, até mesmo na misteriosa luz que arredonda as noites inquietas de um exilado.
Mesmo sem chegar à idade de espreitar a morte, sem ser velho, mas ganhando a velhice por conta de ser doente, o poeta e boêmio serviu-se dos restos de vida a fim de, em apenas oito dias, tentar viver em Paris. E morrer ali, conforme desejou, segundo relato dos contemporâneos.
João do Rio fala dessa Paris, como se ''enfarinhada de neve'', o que parece de liberdade poética, pois nevar ali em setembro há de, antes, confirmar com a meteorologia.
Guimarães Passos foi o último poeta romântico, retrato fiel de uma época, até mesmo ao escrever “O corno da cabra Amaltéia”, um livro de anedotas, que lhe foram abundantes na sua existência de irregularidades.
João do Rio pinta dele este retrato:
''Morreu quase jovem de corpo e com a alma de uma época que não envelhece, mas se classifica. Era egoísta fantasista, era o egoísta bom.''


Estou de acordo.

Jornal do Brasil (Rio de Janeiro) 27/4/2005



ÉBRIO
Querem que eu ria, que o prazer alheio
Seja meu, que o partilhe e o acompanhe;
Que a ventura que banha aos outros, banhe
Meu negro peito de tristeza cheio.

Seja! Bradai; nenhum de vós estranhe
Mais nesta roda um rosto triste e feio;
Quero beber e rir, pois já não creio
Senão que existem males e champagne.

E uma taça após outra fui bebendo;
Sempre bebendo, vi dançar a mesa,
E os meus convivas fui desconhecendo.

Ébrio afinal, caí... mas não sozinho:
Comigo estavas, porque a natureza
Do meu amor embriaga mais que o vinho.

XXIII

Não, nunca saibas a verdade inteira
De minha vida triste e aventurosa,
Porque mais vale uma ilusão fagueira
Que uma realidade dolorosa.

Pensa de mim aquilo que não queira
A mais negra alma sobre si; ditosa
Ou indiferente, ou de qualquer maneira,
No meu estado desgraçado goza.

Faze de mim um péssimo conceito,
Esquece que eu existo e que meu peito
Pelo teu peito pulsa apaixonado.
Antes me odeies, com dó profundo
Digas um’hora: porque veio ao mundo
Quem havia de ser tão desgraçado!

NEL MEZZO DEL CAMMIN...

Seguimos pelo escuro... De mansinho,
Pé aqui, pé ali, seguindo vamos.
Que importa o mundo, se nos adoramos,
Se o ódio humano não vale um teu carinho?

Mais nos unimos quanto mais andamos,
E tudo o que tu pensas adivinho.
Alumiam teus olhos o caminho
E mais seguimos e nos estreitamos

Pelas trevas é tudo um mar de rosas.
Ai! Quem nos diz se a luz nos aguarda
De improviso passagens perigosas!

Queres voltar? Hesitas? Desta sorte
Mais unidos sigamos e não tarda
Que eu ache a vida em sua própria morte.

LONGE
Longe de mim!... Só a amplidão vazia!
Sol, em que céu de bronze te escondeste?
Céu, porque assim tão baixo tu desceste
E esmagas-me se dó desta agonia?
Nem um adeus, ao menos me disseste;
Foste-te e eu, cego, já não tenho guia;
Meus olhos mais nem uma estrela fria
Verão, pois deles desapareceste.
Ah! nunca saibas meu pesar revendo
Tudo aquilo que vias estavas
Nos meus braços de medo e amor tremendo.
Longe de mim!... Por mais que chame e brade,
Apenas ouve as minhas vozes cavas
Esta saudade, esta imortal saudade!

PRISIONEIRO

Que era um pássaro apenas, me disseste,
Porém o nome dele tu ignoras,
Ouviste e ainda ouves vibrações sonoras,
Mas o doce cantor não conheceste.

Pensas em mim, e do tenor celeste
Escutas enlevada as sedutoras
Canções saudosas e comovedoras...
Que ave, perguntas, misteriosa é esta?

Que encantada harmonia, que doçura,
Que magoado cantar!... A todo o instante
Ouves esta garganta ardente e obscura.

Nunca a verás; não queiras vê-la, não!
Deixa que o meu amor oculto cante
N’áurea gaiola do teu coração.

XLI
Sonho que vou contigo ao reino augusto,
À encantada região da eterna glória,
E ante as ardentes vibrações da história,
Trêmulo, os passos triunfantes susto.

Não sei que clarins de ouro de vitória
Estalam no ar, enchendo-nos de susto,
E eu próprio vejo sobre um sol meu busto,
Enquanto os deuses louvam-me a memória.

O teu amor me conduziu a tanto;
Chego à maior de todas as alturas,
Vencendo os mais intérminos caminhos.

Desperto - e os olhos enchem-se de pranto:
Vejo, em vez de venturas, desventuras,
Em vez de louros, vejo só espinhos.

AOS FELIZES
a Henrique Silva

Pensais que invento penas por meu gosto,
Que em meus versos afeto sofrimento?
Néscios? Lede nas linhas do meu rosto,
E com verdade me dizei se invento.

Ride felizes, ride que o desgosto
Nunca deixou de vir; em breve o alento
Que hoje tendes tê-lo-eis como o sol posto:
Longe e brilhando apenas um momento.

"Mas, me direis, como te enganas! Ama,
Ama, que perderás essa tristeza,
Terás ventura, terás glória, fama..."

E eu, por vingar-me, sufocando o ai!
Do coração ferido, com firmeza,
Por meu turno respondo-vos - amai!

MORTE

És negra, és negra, dizem-me os felizes,
Dizem que ao ver-te o vulto atro e sombrio,
Gelam-se os corações, tamanho frio,
Serena, espalhas onde quer que pises.


É que tu levas para um céu vazio,
Onde somente as dores tem raízes,
As esperança todas, e não dizes
Nada a quem fica, nem a quem partiu,

Anjo negro, terror da humanidade,
Morte, estilete que nos toca o fundo
D’alma, enchendo de mágoa e de saudade!
Morte, há no mundo tanta dor contida!
Que, tu, que findas todo o bem do mundo,
És a coisa melhor que há nesta vida.

De Horas mortas (1901)



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